Justiça decide que Correios não podem exigir volta ao trabalho presencial

Publicado em 17/06/2025 às 15:04:51
Justiça decide que Correios não podem exigir volta ao trabalho presencial

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15), sediado em Campinas (SP), concedeu liminar determinando que os Correios não podem obrigar o retorno ao trabalho presencial de funcionários que estão em regime remoto. A medida cautelar impede a implementação do retorno, que estava previsto para a próxima segunda-feira (23).

A estatal informou, quando procurada pela reportagem, que se manifestará apenas nos autos do processo, mas pode recorrer da decisão.

O descumprimento da determinação judicial antes de uma decisão definitiva da Justiça sujeitará os Correios a uma multa diária de R$ 10 mil, com limite inicial de 30 dias.

A ação civil coletiva foi movida pela Associação dos Procuradores dos Correios. Na decisão, o juiz Guilherme Bassetto Petek considerou que a mudança foi imposta unilateralmente pela empresa, sem justificativa técnica individualizada para cada caso e em desacordo com as próprias normas internas dos Correios.

O magistrado apontou a precariedade da estrutura física nas unidades como um dos motivos para a decisão. Ele destacou que a empresa não dispõe de espaço e material suficientes para todos os procuradores, o que demandaria investimentos imediatos, contrariando o princípio da eficiência, especialmente considerando o déficit financeiro atual da Empresa Brasileira de Correios.

Segundo Douglas Melo, diretor do Sintect-SP (Sindicato dos Trabalhadores da Empresa Brasileira de Correios Telégrafos e Similares de São Paulo, Grande São Paulo e zona postal de Sorocaba), o regime remoto abrange principalmente funcionários da área administrativa, embora também inclua o operacional. Ele ressaltou que não há dados precisos sobre o número exato ou a proporção de trabalhadores nesse formato, mas afirmou que não constituem a maioria do efetivo. Melo argumentou que a atividade presencial acarreta mais custos para a empresa, tornando a imposição do retorno incoerente com o objetivo da estatal de cortar despesas.

Os Correios registraram um prejuízo de R$ 2,59 bilhões em 2024 e buscam reduzir gastos em R$ 1,5 bilhão neste ano por meio de medidas como Programa de Desligamento Voluntário (PDV), incentivo à redução de jornada com diminuição de remuneração e suspensão temporária de férias.

Problemas operacionais têm sido apontados pelo Sintect-SP como consequência da situação financeira, incluindo paralisações de motoristas terceirizados por falta de pagamento, acúmulo de encomendas, inadimplência com postos de combustíveis e atraso no pagamento de aluguéis de agências.

Questionados sobre os problemas operacionais na ocasião, os Correios declararam que a prestação dos serviços de transporte ocorria dentro da normalidade e que a empresa trabalhava para resolver eventuais pendências com parceiros, além de adotar medidas para ampliar a capacidade de distribuição.

Na decisão do TRT-15, o juiz acrescentou que os Correios argumentaram, "de forma contraditória", que o retorno de todos os trabalhadores resultaria em economia de gastos. O magistrado contrapôs que é "de conhecimento notório que o trabalho presencial gera maiores gastos", citando o uso de equipamentos, pagamento de vale-transporte e consumo de energia elétrica, entre outros.

O sindicato informou que 65% dos imóveis ocupados por agências dos Correios são alugados, e que pelo menos duas unidades em São Paulo – Campo Limpo, na capital, e Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo – enfrentam situação crítica por falta de pagamento de aluguel.

O juiz de Campinas também entendeu que a reversão para o trabalho presencial viola o artigo 468 da CLT (Consolidação das Leis de Trabalho), que proíbe alterações prejudiciais no contrato sem o consentimento do trabalhador, além de contrariar cláusulas de um acordo firmado anteriormente com o Ministério Público do Trabalho.

A decisão cita, ainda, a violação de princípios como a dignidade da pessoa humana, a função social do contrato, a proteção à saúde, a isonomia e a acessibilidade. O magistrado destacou que "a medida impacta especialmente empregados com filhos com deficiência, idosos ou doenças graves".

Muriel Carvalho Garcia Leal, presidente da Associação dos Procuradores dos Correios, afirmou que a volta ao trabalho presencial colocaria em risco a continuidade dos vínculos laborais, a saúde mental, a estabilidade familiar e a dignidade dos profissionais afetados.

A presidente da Associação declarou que a entidade e seus membros permanecerão vigilantes e mobilizados "para impedir novos retrocessos e evitar que mais colegas se sintam forçados a pedir demissão diante de condições incompatíveis com uma prestação de serviço justa, eficiente e humana".

Movimentos semelhantes de contestação a mudanças no regime de trabalho remoto ocorrem em outras estatais. Na Petrobras, por exemplo, a redução do home office de três para dois dias semanais gerou protestos de parte dos funcionários administrativos, embora a empresa afirme que a maioria das representações sindicais aprovou o acordo.