Justiça dos EUA reconhece que brasileira tem direito de solicitar asilo após perseguição religiosa

Publicado em 13/06/2025 às 15:22:50
Justiça dos EUA reconhece que brasileira tem direito de solicitar asilo após perseguição religiosa

Uma brasileira que buscou refúgio nos Estados Unidos após ser alvo de ameaças devido à sua prática do candomblé obteve uma importante vitória legal. A Corte de Apelações do 9º Circuito, com sede na Califórnia, reconheceu o direito dela de solicitar asilo no país com base em perseguição religiosa.

A decisão unânime dos três juízes do colegiado reverte pareceres anteriores da Justiça de imigração americana, que haviam classificado os ataques sofridos pela brasileira como meros atos de discriminação – insuficientes para qualificá-la como elegível à condição de refugiada.

Segundo relatos do processo, a brasileira começou a frequentar cultos de candomblé na adolescência, sem o conhecimento de seus pais católicos. Em 2010, sua casa foi invadida por agressores que assassinaram seu pai e proferiram insultos religiosos contra os moradores, chamando-os de "bruxas" e "feiticeiras".

A partir desse episódio, a brasileira passou a viver sob constante ameaça. A fachada de sua residência foi alvo de pichações ofensivas, ela e o marido enfrentaram dificuldades em encontrar emprego, e seus filhos sofreram bullying na escola. Diante da escalada da violência, que a obrigou a abandonar sua religião ou praticá-la clandestinamente, a família decidiu deixar o Brasil.

O novo entendimento da Justiça americana reconhece que a brasileira e seus familiares poderiam correr sério risco de morte caso fossem forçados a retornar ao seu país de origem. O tribunal destacou que há "fartas evidências" de que a requerente foi vítima de "assédio, vandalismo recorrente e em escala crescente, além de uma ameaça de morte durante uma invasão domiciliar armada".

A corte determinou que o caso seja reavaliado pelo Conselho de Apelações de Imigração (BIA), que deverá considerar provas anteriormente ignoradas, como registros de ataques a terreiros em diversas regiões brasileiras.

O drama vivido pela brasileira reflete um cenário mais amplo de aumento da violência religiosa no Brasil, particularmente contra religiões de matriz africana. Dados citados pelo relator do processo, juiz Richard Paez, apontam um crescimento de quase dez vezes na hostilidade contra essas religiões entre 2016 e 2019. Somente em 2019, mais de 200 terreiros foram fechados devido a ameaças, o dobro do ano anterior. Conforme Paez, esse aumento da violência está ligado ao avanço do fundamentalismo religioso no país, por vezes com a participação de facções criminosas.

Atualmente, a brasileira reside em Tracy, Califórnia, com o marido e o filho mais novo, de 9 anos. Dois outros filhos permanecem no Brasil com a avó materna. O marido e o filho que vivem nos EUA foram incluídos como beneficiários em seu pedido de refúgio.

Mesmo após chegar aos Estados Unidos, a brasileira continuou a ser perseguida. Em setembro de 2021, um homem encapuzado invadiu sua casa e a ameaçou com uma arma, proferindo: "Bruxa, saia desta cidade com sua família da macumba. Isso é só um aviso. Da próxima vez, você não vai sobreviver".

Apesar desse histórico, o pedido inicial de asilo foi negado por um juiz de imigração, que argumentou que a requerente não havia sofrido ferimentos físicos duradouros e que sua alegação de perda de oportunidades de emprego por motivos religiosos era "especulativa".

A Corte federal de apelações, entretanto, concluiu que a Justiça de imigração falhou ao não reconhecer o padrão de perseguição sistemática contra religiões de matriz africana no Brasil. Com a nova decisão, cabe agora ao governo norte-americano comprovar que a brasileira e sua família estariam em segurança caso retornassem ao Brasil.