Brasil foi destino da 1ª viagem internacional de Francisco como papa; entenda relação com o país

Papa Francisco, falecido nesta segunda-feira (21) aos 88 anos, cultivou uma relação singular entre o Brasil e o Vaticano, que ia além de anedotas e se refletia em ações concretas. O pontífice, que demonstrava conhecer e até cantar marchinhas carnavalescas sobre a cachaça, aproximou-se do país de diversas maneiras.
Sua primeira viagem internacional como Papa foi ao Rio de Janeiro, para a 28ª Jornada Mundial da Juventude em 2013. Na ocasião, expressou a Dilma Rousseff, então presidente do Brasil, a importância dos laços entre o país e a Santa Sé. Esses laços, no entanto, já eram antigos.
Quando cardeal, Jorge Mario Bergoglio participou ativamente da Conferência de Aparecida em 2007, onde defendeu uma Igreja mais próxima dos marginalizados e atenta à religiosidade popular. Segundo o vaticanista Filipe Domingues, o Papa teve um "papel essencial" na produção do documento final da Conferência.
Dom Cláudio Hummes, arcebispo emérito de São Paulo, teve um papel importante na escolha do nome papal de Francisco, inspirada no santo que dedicou sua vida aos mais necessitados. Atualmente, a alta hierarquia da Santa Sé conta com diversos brasileiros, como Dom Ilson de Jesus Montanari e Monsenhor Marcos Pavan. O cardeal João Braz de Aviz também teve papel de destaque no Vaticano, sendo substituído em 2025 pela freira italiana Simona Brambilla.
Em 2022, Francisco nomeou dois novos cardeais brasileiros: Dom Paulo Cezar Costa e Dom Leonardo Steiner, este último arcebispo de Manaus, reforçando a preocupação do Papa com questões ambientais. Em 2024, Dom Jaime Spengler, arcebispo de Porto Alegre, também se tornou cardeal.
Em 2019, o Papa convocou o Sínodo da Amazônia, um encontro inédito para debater questões ambientais e indígenas, que coincidiu com o primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro e gerou críticas por parte do então presidente. Francisco também condenou as queimadas na Amazônia, atribuindo-as a "interesses que destroem" e defendendo a necessidade do "fogo do amor de Deus" na região.
O pontífice também fez declarações consideradas críticas ao governo Bolsonaro, como o pedido para que Nossa Senhora Aparecida livrasse o povo brasileiro "do ódio, da intolerância e da violência", o que gerou suspeitas de simpatia pelo então candidato Lula.
O afeto de Francisco por Lula, que vem desde a época em que o Papa era arcebispo de Buenos Aires, se manifestou em diversas ocasiões, incluindo uma carta enviada durante a prisão do petista e declarações sobre a injustiça da condenação na Lava Jato.
Para o vaticanista Domingues, a familiaridade que o Brasil encontrou em Francisco, um Papa não europeu, foi fundamental em um país que tem perdido católicos para outras religiões. Essa proximidade se refletia em gestos como brincar com a rivalidade entre Brasil e Argentina no futebol, ou cantar marchinhas sobre a cachaça. Em visita a uma favela carioca, o Papa brincou sobre a preferência por um café em vez de uma cachaça. No entanto, em sua biografia, consta que Francisco apreciava harmonizar suas refeições com vinho.