Entenda o que acontece com a trégua entre Israel e Irã

Um frágil cessar-fogo entre Israel e o Irã, orquestrado por Donald Trump com apoio do Qatar, trouxe um alívio temporário para civis e permitiu que as partes envolvidas declarassem vitória. No entanto, a história demonstra que tais acordos pontuais raramente abordam as questões fundamentais que impulsionam o conflito. A análise aponta Israel como o principal beneficiário, vendo seu governo de Benjamin Netanyahu consolidado em meio à condenação internacional e à guerra em Gaza. A ação iraniana, embora tenha causado danos, expôs a fragilidade militar do país sem o suporte de seus aliados regionais, como o Hezbollah.
Apesar de sua resiliência e da capacidade de discurso de ter retaliado a Israel e aos Estados Unidos, o Irã enfrenta desafios internos e um desgaste social e econômico preexistente. A pressão popular, essencial para uma mudança de regime, é suprimida em tempos de conflito.
Donald Trump, por sua vez, demonstrou a capacidade de projeção de poder dos EUA, bombardeando instalações nucleares iranianas. Contudo, sua estratégia visava tanto apoiar Israel quanto retirar rapidamente os EUA do conflito, atendendo à sua base eleitoral avessa a intervenções estrangeiras. A participação americana foi marcada pela aceitação de uma retaliação iraniana orquestrada, levantando dúvidas sobre a sustentabilidade dessa abordagem caso a situação se agrave novamente.
O programa nuclear iraniano, o motivo original do ataque israelense, sofreu um atraso. A duração desse atraso é incerta, dada a falta de conhecimento sobre os danos exatos às instalações e a movimentação de materiais e urânio enriquecido por parte do Irã. Isso levanta a possibilidade de o país acelerar a produção de armas nucleares ou utilizar o material para armas radiológicas.
A verificação do programa nuclear iraniano é um ponto de interrogação, especialmente com a afirmação de Trump de que o programa está "acabado", uma visão não corroborada pela realidade. A retomada de negociações entre EUA e Irã é incerta, e o papel da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) é comprometido pelas violações de transparência nuclear por parte do Irã e as ameaças de saída do Tratado de Não Proliferação Nuclear.
Existe um impasse claro: o Irã insiste em manter sua capacidade de enriquecimento e se recusa a depender de combustível nuclear fornecido por outros países. A vulnerabilidade militar de Teerã pode, no entanto, influenciar futuras decisões, inclusive a possibilidade de um novo regime de inspeções, similar ao acordo de 2015 que Trump abandonou.
O cessar-fogo também impacta a situação em Gaza e a atuação dos Houthis. O Qatar, com mísseis iranianos passando sobre seu território, retomou conversas com Israel e Egito para um cessar-fogo em Gaza e o fim do bloqueio israelense. Para Netanyahu, essa discussão implica revisitar o fracasso de inteligência de 7 de Outubro e a questão dos reféns, além da tragédia em Gaza. Embora possa adiar a questão, a posição fortalecida de Netanyahu pode levar a soluções mais duras. O foco do governo israelense volta-se para Gaza em termos belicosos. Os Houthis, por sua vez, perdem a justificativa para suas ações com o cessar-fogo, possivelmente recuando de suas operações no Mar Vermelho após terem sido bombardeados.