Justiça expande defesa via gravação de vídeo e gera protestos da OAB

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e outras entidades da advocacia têm expressado forte insatisfação com as novas regras para julgamentos eletrônicos e sustentações orais gravadas, intensificada após a publicação da resolução 591 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em setembro. A norma estabelece requisitos mínimos para esses procedimentos em todo o Judiciário.
O presidente reeleito da OAB, Beto Simonetti, reafirmou o posicionamento contrário da entidade durante sua posse, na presença do ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF e do CNJ. Simonetti defendeu a importância das sustentações orais para a valorização do direito à justiça do cidadão.
Em resposta às críticas, Barroso orientou os órgãos do Judiciário a evitar o modelo assíncrono (não simultâneo) como regra, reservando a sustentação oral por gravação para casos em que a modalidade presencial cause grande disfuncionalidade.
A implementação das novas regras chegou a ser suspensa a pedido dos tribunais, que ganharam um prazo de 180 dias para adaptação. Simonetti celebrou a decisão, afirmando que a norma compromete o exercício da advocacia.
O modelo ampliado pela resolução do CNJ permite que defesa e acusação apresentem seus argumentos por meio de arquivos de áudio ou vídeo gravados previamente, sem a presença física, o que é visto pelos representantes da advocacia como um enfraquecimento das garantias de ampla defesa.
A virtualização da Justiça também foi questionada em ações penais relacionadas aos eventos de 8 de janeiro, conduzidas pelo ministro Alexandre de Moraes no STF. A OAB solicitou que os réus fossem julgados presencialmente, considerando a relevância e excepcionalidade das ações. O Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) também manifestou preocupação com as sustentações orais assíncronas nesses casos.
Em resposta ao impasse, a OAB apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para assegurar o direito dos advogados à sustentação oral em qualquer sessão de julgamento, buscando retirar dos regimentos internos dos tribunais a decisão sobre o tema.
Um dos pontos críticos da resolução é a ausência de distinção entre classes processuais e temas para o uso de sustentações gravadas. O presidente do IDDD, Guilherme Carnelós, alerta que erros decorrentes do trâmite virtual podem ser especialmente prejudiciais em ações penais, que envolvem a liberdade humana. Ele defende que o contato presencial pode ser crucial para evitar erros dos magistrados na tomada de decisões.
Carnelós questiona o argumento da celeridade como justificativa para a virtualização, afirmando que uma Justiça mais rápida é um direito do acusado, não um benefício para o magistrado, e não deve prejudicar a defesa.
Outro ponto de atenção é a discricionariedade na transferência de processos eletrônicos para audiências presenciais, dependendo da aceitação do relator ao pedido de destaque feito pelo advogado.
A decisão do CNJ que prorrogou os prazos para implementação das normas também abordou o tema do destaque, afirmando que as novas regras não devem ser interpretadas como uma vedação ao destaque automático ou como uma restrição às possibilidades de destaque.
A resolução permite que os tribunais adotem regras internas distintas, influenciando o poder dos advogados na decisão sobre o julgamento presencial. No TJ-SP, por exemplo, os processos são automaticamente retirados do julgamento eletrônico após um pedido de destaque.
A resolução também obriga a divulgação pública dos votos em julgamentos virtuais no momento em que são disponibilizados, algo que ainda não é padronizado em todo o Judiciário.
Um desembargador do TJ-SP expressou preocupação com a publicidade imediata, argumentando que ela pode diminuir o espaço de discussão entre os magistrados e inibir mudanças de posição após a publicação dos votos.
Carnelós rebateu essa visão, defendendo que a publicidade dos julgamentos deve ser reafirmada tanto nos votos quanto na possibilidade de intervenção dos advogados durante as sessões.
A virtualização da Justiça já havia sido criticada em outros momentos, como na resolução do STF sobre o plenário virtual durante a pandemia e nos julgamentos dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro. Em ambas as situações, a OAB se manifestou formalmente, defendendo o contraditório e a ampla defesa.