Lula volta de giro internacional pressionado por crise do INSS e atritos internos

Após série de viagens internacionais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) retorna ao Brasil diante de um cenário político interno turbulento. O chefe do Executivo enfrenta a administração da crise gerada pelo escândalo de descontos irregulares em aposentadorias e pensões do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), que pode culminar na instalação de uma CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) no Congresso Nacional. Soma-se a isso atritos entre ministros e instabilidade na base de apoio do governo.
Esses novos focos de desgaste emergem no momento em que o governo federal buscava reverter a queda na popularidade da gestão. Ambos os episódios têm sido amplamente explorados pela oposição para atacar o Executivo e, conforme indicado por pesquisas internas, neutralizaram os esforços de recuperação da avaliação do presidente.
Lula esteve em viagens internacionais acompanhado por comitiva de parlamentares e ministros. Visitou a Rússia no dia 7, seguiu para a China, onde permaneceu até quarta-feira (14), e nesta quinta-feira (15), participou do funeral de José Pepe Mujica no Uruguai.
A viagem à China foi marcada pelo vazamento de uma conversa entre o presidente, a primeira-dama Rosângela Lula da Silva (Janja) e o líder chinês, Xi Jinping, sobre a rede social TikTok.
Embora Lula tenha negado qualquer desconforto com as autoridades de Pequim, o incidente expôs o governo, gerando acusações sobre a responsabilidade pela divulgação à imprensa. O episódio irritou o presidente da República, que chegou a criticar publicamente o ocorrido.
Conforme noticiado pela coluna Mônica Bergamo, o petista fez questão de expressar seu contrariedade e inconformismo com o vazamento aos ministros que o acompanhavam na viagem.
Segundo relatos de dois integrantes da comitiva, Lula chegou a proibir que qualquer autoridade que retornava ao Brasil com ele descesse do avião durante uma parada técnica na Rússia. A medida foi interpretada como uma tentativa presidencial de evitar novos vazamentos, evidenciando o clima de desconfiança entre membros do governo.
Além disso, conforme relatado à reportagem, o ministro Rui Costa (Casa Civil), apontado como principal suspeito do vazamento da conversa, teria se queixado a interlocutores durante o voo. De acordo com dois integrantes da comitiva, ele afirmou que precisa se preocupar não apenas com adversários políticos, mas também com os próprios aliados.
Na véspera do retorno ao país, aliados do presidente da República expressavam a expectativa de que Lula assumisse uma postura ativa para conter os atritos entre integrantes de seu governo e evitar que esses conflitos gerassem mais danos à imagem da gestão.
Além das disputas internas relacionadas ao vazamento, Rui Costa recentemente expôs publicamente divergências com o ministro da CGU (Controladoria-Geral da União), Vinicius de Carvalho, a respeito do escândalo no INSS.
Durante o detalhamento das medidas de combate às irregularidades, Carvalho foi questionado se havia informado o governo sobre os indícios de ilegalidades durante o curso das investigações. Integrantes do governo criticaram internamente essa conduta. Essa crítica veio à tona em uma entrevista de Rui Costa ao jornal O Globo.
Sob pressão no Palácio do Planalto, o chefe da CGU defendeu seus procedimentos, listando reuniões realizadas ao longo do processo, mas evitou rebater diretamente as críticas do colega da Casa Civil. "Vivemos um momento em que algumas informações são tratadas de forma inadequada para gerar desinformação. É prejudicial", declarou. "O presidente Lula nos orienta a não tergiversar em relação ao combate às fraudes. Foi o governo do presidente Lula que garantiu e garante a autonomia necessária para coibir esse tipo de coisas."
Conforme já noticiado pela Folha de S.Paulo, apesar da resistência do Palácio do Planalto, membros do governo e parlamentares da base aliada admitem dificuldades para impedir a instalação da CPMI do INSS no Congresso.
Diante desse cenário, aliados de Lula já discutem e traçam estratégias para mitigar danos, com o principal foco na ampliação da investigação para incluir também o governo Jair Bolsonaro (PL) no centro dos trabalhos da comissão.
Em meio à pressão do Congresso, na sexta-feira (16), o presidente reuniu-se com ministros do núcleo duro do Palácio do Planalto e com Wolney Queiroz, ministro da Previdência Social. Estiveram presentes Gleisi Hoffmann (Secretaria de Relações Institucionais), Sidônio Palmeira (Secom) e Rui Costa, além do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).
O Executivo se opõe à instalação da CPMI por temer que a condução da investigação seja fortemente influenciada pela oposição. Além disso, avalia-se que a atuação da comissão poderia relegar a segundo plano projetos considerados prioritários pelo governo federal que tramitam no Congresso, como a proposta de isenção do IR (Imposto de Renda) para quem ganha até R$ 5.000.
Desde que a Polícia Federal e a CGU deflagraram a operação, integrantes do Palácio do Planalto e governistas têm adotado o discurso de que as ilegalidades tiveram início em gestões anteriores, mas foram expostas e investigadas sob o governo petista. Essa deve ser a linha argumentativa caso a CPMI seja instalada. A estratégia visa ocupar espaços considerados chave no colegiado, em uma tentativa de confrontar a oposição.
Apesar disso, persiste o receio sobre como a base do governo federal atuará na comissão. Há queixas de congressistas a respeito do ritmo do pagamento de emendas parlamentares e do que consideram uma "paralisação" do Executivo, sem a apresentação de programas ou propostas concretas para reverter a queda de popularidade.
Também existem críticas de integrantes do centrão sobre as trocas ministeriais realizadas por Lula. O presidente sinalizou a auxiliares que o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) deverá ser anunciado ministro da Secretaria-Geral da Presidência, substituindo Márcio Macêdo (PT).
A provável ida de Boulos para um assento no Planalto gerou resistência no centrão. Alegam que esse movimento, caso se concretize, será mais um sinal de que o Executivo busca se aproximar da esquerda. Nas palavras de um deles, isso também aumenta a pressão interna que esses partidos recebem de seus representantes por um afastamento da base do governo federal. Outro político do grupo afirma que a situação reflete uma perda de capacidade do Executivo em dialogar com o centro político.