Ter onde morar é maior desafio no RS um ano após enchentes históricas

Publicado em 29/04/2025 às 10:47:32
Ter onde morar é maior desafio no RS um ano após enchentes históricas

"É uma tortura, um sufoco, um desespero total. Não sei se falo ou se choro", desabafa o gari aposentado Reni da Rosa, de 66 anos, sobre a situação em que ele e sua esposa, Noemia da Rosa, de 65 anos, se encontram um ano após as enchentes históricas que assolaram o Rio Grande do Sul entre abril e maio de 2024.

O casal perdeu sua casa na cheia do rio Taquari, em Arroio do Meio, e desde então buscou abrigo com familiares, chegando a receber uma casa de madeira por meio de doação, que também foi danificada por um temporal. Atualmente, Reni e Noemia vivem em uma das moradias temporárias do governo estadual, um espaço de 27 metros quadrados que lembra um contêiner.

Apesar de agradecer pelo teto, Reni lamenta o impacto da tragédia: "É uma dor de cabeça. Tu não dorme porque não é o teu cantinho", expressa, sonhando com a reconstrução da casa doada. Assim como eles, milhares de gaúchos aguardam por lares definitivos um ano após o desastre.

Políticos, líderes comunitários e especialistas apontam que acelerar a entrega de moradias seguras é o principal desafio da reconstrução. Um levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM) indicou que as chuvas destruíram 9.300 habitações e danificaram outras 104,3 mil.

O economista e pesquisador Ely José de Mattos, do PUCRS Data Social, ressalta a importância da moradia como prioridade na recuperação. Ele destaca a complexidade de construir casas, que envolve terreno, infraestrutura, recursos financeiros e tempo.

Até o momento, o governo federal contratou e entregou 1.549 moradias através do programa Compra Assistida do Minha Casa Minha Vida, voltado para famílias com renda de até R$ 4.700. Além disso, autorizou a construção de 7.470 novas unidades habitacionais, com a meta de atender cerca de 20 mil famílias, segundo o secretário do governo federal para Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, Maneco Hassen.

O governo estadual, por sua vez, tem 1.300 casas definitivas com projetos em andamento, de um total de 2.235, com as primeiras entregas previstas para maio. A prioridade inicial foi oferecer lares temporários para desativar abrigos e garantir moradia digna às famílias desabrigadas. Atualmente, 383 pessoas ainda estão em abrigos no estado, um número bem menor do que os 78,7 mil registrados no início do levantamento, em maio de 2024.

O governador Eduardo Leite (PSDB) reconhece a complexidade da situação, com milhares de residências atingidas em diversos municípios, e afirma que o estado estava começando a desenvolver suas próprias políticas habitacionais quando as enchentes aumentaram exponencialmente a necessidade.

A agente comunitária de saúde Simone Cardoso, de 54 anos, também aguarda por uma moradia. Sua antiga casa foi destruída pela cheia do rio Taquari em Roca Sales, e ela e o marido estão morando em um sobrado cedido por um amigo. "As coisas estão bem atrasadas", lamenta.

O prefeito de Roca Sales, Jones Wunsch, estima que cerca de 2.000 pessoas deixaram a cidade após as enchentes, que já haviam causado destruição em 2023. Ele busca atrair moradias para que as pessoas voltem e as empresas possam suprir a falta de mão de obra.

Em Arroio do Meio, o prefeito Sidnei Eckert afirma que há demanda por cerca de 700 casas para famílias atingidas pelas enchentes. Ele critica a falta de preparação do país para lidar com desastres climáticos, a burocracia e os gargalos de infraestrutura que dificultam a entrega rápida das moradias. "Enquanto não tiver as famílias nas suas casas, tu não podes estar tranquilo como gestor", conclui.