Lei Anti-Celular nas Escolas: Sucessos, Desafios e o Dilema Pedagógico

O primeiro semestre da lei que proíbe o uso de celular em escolas brasileiras trouxe mudanças significativas na rotina de estudantes e educadores. Relatos de professores e governantes apontam para uma maior interação entre colegas e uma melhora notável na atenção em sala de aula. No entanto, o uso pedagógico dos aparelhos ainda gera confusão e debate.
A norma, sancionada pelo presidente Lula em 13 de janeiro e válida para toda a educação básica, foi implementada de maneiras distintas pelos estados. Enquanto alguns adotaram uma abordagem mais flexível, outros optaram por regras mais rigorosas. A lei federal não detalha a forma de guarda dos celulares pelos alunos, apenas a proibição de seu uso em todos os espaços escolares. Em contraste, a legislação paulista, aprovada em dezembro, exige que os aparelhos sejam guardados fora do alcance dos estudantes, em locais designados como caixas.
Renato Feder, secretário de Educação de São Paulo, considera a aplicação da lei um sucesso, definindo-a como "uma das melhores notícias dos últimos tempos". Segundo ele, visitas a mais de cem escolas revelaram relatos positivos, com a comunidade escolar percebendo um ambiente mais agradável, alegre e estimulante, com o resgate de brincadeiras tradicionais. Essa percepção é compartilhada por colégios particulares, como o Bandeirantes, onde a diretora de convivência, Estela Zanini, observa que a lei federal contribuiu para um ambiente mais focado e propício à aprendizagem, com alunos mais atentos e engajados.
Professores relatam menos interrupções, mais tempo de ensino efetivo e maior facilidade na assimilação do conteúdo, o que deve impactar positivamente os resultados acadêmicos. Murilo Nogueira, diretor administrativo da Fundação Bradesco, que implementou o banimento de celulares em suas 40 escolas ainda no final de 2023, ecoa essa visão, destacando o objetivo de criar um ambiente "mais humano, seguro e focado na aprendizagem".
Outros estados também celebram melhorias na convivência estudantil e investimentos em atividades coletivas. Na Bahia, o governo Jerônimo Rodrigues oferece aulas de artes, programação e grupos de terapia para alunos em horários vagos. Embora os alunos possam portar seus aparelhos, eles são instruídos a desligá-los em sala de aula, mas o uso durante os intervalos ainda é expressivo.
No Rio de Janeiro, o governo Cláudio Castro investe na requalificação de espaços físicos, como quadras poliesportivas, visando fomentar a socialização. Roberta Barreto, secretária de Educação fluminense, ressalta que o combate à hiperconectividade deve ir além da regulação, priorizando alternativas pedagógicas e espaços coletivos de qualidade.
**Resistência e Desafios na Implementação**
Apesar dos avanços, enfrentam-se desafios. Em Pernambuco, há relatos de estudantes que se recusam a cumprir a norma, com cada caso sendo tratado com "muito cuidado e escuta", segundo Adriana Amorim, gestora de políticas pedagógicas. Em São Paulo, as ocorrências de uso inadequado de celular diminuíram 70% entre fevereiro e junho, segundo o secretário Feder.
Um gargalo persistente é o uso pedagógico dos celulares. Professores apontam que, ao liberarem o uso para fins de estudo, muitos alunos se distraem com redes sociais e outras atividades. Fernando Cassio, professor da USP e membro da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, salienta que a implementação de políticas públicas enfrenta dificuldades de convencimento, pois a dependência de telas afeta não só jovens, mas também pais que utilizam os aparelhos para monitorar os filhos. A ansiedade dos adultos ao serem privados do contato virtual exige um diálogo escolar para garantir a segurança e o bem-estar dos alunos.
A "plataformização" do ensino, proposta pela Rede Escola Pública e Universidade (Repu), é apontada como mais um obstáculo. Um estudo da Repu criticou o investimento de São Paulo em ferramentas digitais, argumentando que o uso de tablets e computadores para atividades didáticas pode, paradoxalmente, aumentar o tempo de tela, desvirtuando o propósito da lei. A gestão Tarcísio de Freitas defende a integração de recursos digitais, afirmando que, com planejamento e acompanhamento, ela pode melhorar o engajamento e o processo de ensino-aprendizagem.